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    Amor Sem Limites

    Amor Sem Limites – Psicografia de Divaldo Franco

    “Cada alma vê, no próximo, aquilo que tem no seu interior, e cada coração recebe a Mensagem, de acordo com a própria necessidade
     
     
    A construção não obedecia a qualquer planificação anterior.
    Nascida por efeito da necessidade de socorrer aqueles que não tinham onde repousar as fadigas nem os desgastes orgânicos, era um reduto de amor, evocando a presença do Crucificado sem culpa.
    Situada às margens da estrada entre Jerusalém e Jopa, fora erguida pelas mãos cansadas de Simão Pedro, ajudado por alguns companheiros afeiçoados à Mensagem, então viva nas mentes e nos corações.

     A peça principal com características rústicas era dedicada às reuniões para o estudo da Palavra do Senhor, aos comentários e à assistência rápida aos enfermos que se podiam movimentar.

    Lentamente foram surgindo os moribundos que não tinham para onde seguiu, e foram construídos em derredor outros compartimentos, que seriam ocupados pelas criancinhas abandonadas e velhinhos em desvalimento, perturbados da mente e obsessos, que ali eram deixados pela indiferença de familiares impiedosos e amigos cruéis.

    À medida que se tornava conhecida a Casa do Caminho, maior número de sofredores chegavam com freqüência em busca de piedade e de apoio.

    As dificuldades se multiplicavam na medida em que a escassez de recursos crescia, em relação ao número de bocas esfaimadas que chegavam…

    Numa visão geral, aqueles diversos blocos de construção modesta faziam recordar dois braços abertos que no centro albergassem uma edificação maior.

    Podia-se concluir que ali, as mãos espalmadas da caridade sustentavam a fé, a fim de que nunca se apagasse a luz da esperança.

    O pescador de Cafarnaum era a figura central da atividade socorrista, ao redor de quem circulavam os problemas e afazeres complexos.

    Tiago, mais afervorado à interpretação do pensamento de Jesus, preocupado com a preservação do Pentateuco Mosaico, mantinha-se relativamente distante das atividades exaustivas e do contato com as pessoas que considerava impuras, que repletavam as dependências do refúgio de caridade.

    Parecia-lhe, não poucas vezes, um desperdício de forças e de trabalho toda aquela movimentação e sacrifício que podiam ser canalizados para a salvação das almas, que se compraziam na observância da Lei como dos Profetas e demonstravam interesse pelo conhecimento da Boa Nova.

    Simão, que conhecia de perto a pobreza e sentia o sofrimento, mais se afervorava à ação libertadora da beneficência, permanecendo, não raro, até avançadas horas no atendimento aos chegados e combalidos, aos atormentados e desfalecentes.

    Quando a noite, cintilante de estrelas, anunciava a sua plenitude, é que, cansado, buscava a enxerga para o repouso de poucas horas.

    Tão natural se lhe fazia a rotina que chegava a esquecer das fadigas e de si mesmo, tentando reabilitar a consciência de culpa, decorrente das negações em referências ao mestre…

    Sempre que era convidado aos comentários públicos, testemunha dos momentos do Evangelho, reportava-se à Grandeza do Amigo e à sua fragilidade de companheiro invigilante.

    O verbo, nos seus lábios, vertido do coração sensível, adquiria tons de beleza, autenticada pelo magnetismo de sua vivência.

    Tornara-se desse modo, figura obrigatória nas narrações dos atos do Mestre, que os freqüentadores da Casa passaram a amar com respeito e consideração.

    As notícias fascinantes, por sua vez, atraíam maior número de interessados.

    Porque se tratava do Lar de todos, onde se romperam as barreiras do preconceito e do separativismo, os doentes morais e os equivocados passaram a freqüentá-lo com indisfarçável alegria. Afinal, os ensinamentos eram-lhes dirigidos como fórmula eficaz para a liberação dos seus problemas e delitos.

    Compreensível, que se misturassem as pessoas tidas como de má vida com as outras, consideradas virtuosas, que se constrangiam em ter que as suportar.

    Algumas mulheres, reconhecidamente levianas e vendedoras de ilusão, sentiam-se tocadas pela bondade do galileu e tornaram-se habituais participantes das explicações semanais à tarde.

    Dentre elas, conhecida pecadora passou a apresentar alteração de conduta, exigindo do pregador maior soma de atenção e assistência.

    Voltado para as recordações do Mestre e as tarefas junto aos infelizes, Simão não percebeu o encantamento que passou a dominar a aprendiz em relação à sua palavra e sua pessoa.

    Pôs-se a assediá-lo, a pedir-lhe ajuda, desviando-lhe dos compromissos de urgência, até o momento em que se lhe desvelou, num misto de sofrimento e cinismo.

    Colhido pela surpresa rude, o filho de Jonas perturbou-se, sem saber como proceder.

    Recordou-se da juventude louçã (Que tem muita beleza, elegância, garbo.), das experiências conjugais, da viuvez, do compromisso com Jesus e, diante daquela mulher ofegante, visivelmente perturbada, que lhe impunha uma definição, sentiu-se atordoar, sem identificar por qual caminho seguir, quais palavras dizer.

    Certamente, não mantinha qualquer outro sentimento, senão o de piedade pela irmã sofrida, que se lhe apresentava consumida pelas labaredas da paixão mal contida, agitada por espíritos infelizes que se propunham ao escândalo e à hediondez.

    Num átimo de minuto recordou-se do Mestre, e imaginando o que melhor convinha para o momento, justificou-se:

    - O amor que te devoto é do espírito e somente nele podemos aguardar bênçãos. Elegi a morte do corpo, a fim preservar a vida, quando abracei a cruz do Mestre e não vejas em mim, nada mais que um cadáver que respira, aguardando pela libertação que virá.

    A obsidiada, ralada pelo desespero do vício, instou nos propósitos inferiores de que se fazia objeto e tentou despir-se diante do discípulo constrangido que a orientava.

    Com os olhos nublados de pranto e túmido o peito, Simão a deteve, considerando:

    - Verifico o meu fracasso mais uma vez… Intentando apresentar Jesus aos meus ouvintes, apenas logrei expor as minhas feridas… Referindo-me às glórias do “Reino de Deus”, inspiro paixões avassaladoras, conclamando à verdade, conduzo apenas à alucinação. Perdoa-me filha, se não logrei levantar-te, mas ao mesmo tempo, ajuda-me a não te afogar mais no pantanal.

    “Nossa Casa é tua e volta aqui quantas vezes queira e possas. Todavia, não te esqueças, que é também a Casa onde Jesus habita e age, trabalha e repousa, convidando-nos a todos para o banquete da redenção que nos espera. Por agora, vai-te em paz e deixa-me na paz que encontraste, ao chegar aqui.”

    A Aturdida, vitimada por compreensível crise de revolta, blaterou, chamou a atenção e partiu assacando acusações e injúrias ácidas, que maceraram o apóstolo dedicado.

    Naquela noite, após as rudes refregas do dia, repousando sob velha figueira no pátio, Simão contemplou os astros lucilando no infinito e recordou-se dos encontros com o Mestre, no seu lar, próximo ao lago, em Cafarnaum…

    A recordação natural e rica de saudade, fê-lo comover-se.

    Sem dar-se conta, deixou a mente viajar pelas estradas das evocações, ao mesmo tempo em que se culpava da própria inferioridade.

    Nesse estado, embora ouvindo a algaravia dos alienados nos compartimentos próximos, o latido dos cães esfaimados em derredor e a música mágica da Natureza, percebeu, além da cortina de lágrimas, o vulto alvinitente do Mestre, Sereno, como na ocasião em que caminhou sobre as ondas do mar na direção do barco…

    Desejou explodir em júbilo, relatar a ocorrência, ouvi-lO, mas não teve tempo, porquanto, o Amigo o confortou, de imediato, elucidando:

    -A chama que coze o pão atrai a mariposa que, descuidada, nela se consome… O discípulo do meu Evangelho é um ponto vivo de referência onde quer que se encontre, atraindo as atenções e sendo vítima das circunstâncias, em constante perigo, nunca, porém, em abandono, esquecido do meu amor.

    “Não te martirizes, nem temas. A água refrescante e cristalina que mata a sede, é também usada para diluir venenos terríveis de ação rápida.

    “Cada alma vê, no próximo, aquilo que tem no seu interior, e cada coração recebe a Mensagem, de acordo com a própria necessidade.

    “Permanece fiel e não desfaleças em ocasião alguma.

    “O sacrifício maior e mais agradável ao Pai, é a sublimação do filho, na luta diária, ganhando vida e valor no atrito com o mundo, que o não respeita, porém, onde ele realiza a sua ascensão para os altos cimos.

    “Não te perturbes no exame do tormento da nossa irmã, com desprezo pela sua torpeza. Ama-a mais e a claridade do seu amor luarizar-lhe-á a alma, acalmando-lhe a loucura e desenovelando-a do cipoal de trevas a que se junge. Só o amor, Simão, possui a força mágica para solucionar todos os problemas.

    “Por isso, ama e ama com paciência sempre, confiando no Pai Todo Amor que governa o Universo.”

    Pedro desejou alongar a entrevista, no entanto, a figura diáfana se diluiu diante dele.

    Voltando à realidade ambiental, Simão, renovado, passou a amar a todos com tal intensidade que, a partir dali, jamais tergiversou ou temeu, até o momento do martírio na cruz, em Roma, vários anos mais tarde.

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