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A Lei Divina ou Lei Natural - 175

O LIVRO DOS ESPÍRITOS
LIVRO TERCEIRO
CAPÍTULO I
AS LEIS MORAIS


A LEI DIVINA OU NATURAL
 
 
1. Caracteres da lei natural. - 2. Origem e conhecimento da lei natural. - 3. O bem e o mal - 4. Divisão da lei natural.
 
 


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1 - Caracteres da lei natural

 

614. Que se deve entender por Lei Natural?

A Lei Natural é a Lei de Deus. É a única verdadeira para a felicidade do homem.

Indica-lhe o que deve fazer ou deixar de fazer e ele só é infeliz quando dela se afasta.” 

 


615. É eterna a lei de Deus?

“Eterna e imutável como o próprio Deus.”

  


616. Será possível que Deus em certa época haja prescrito aos homens o que noutra época lhes proibiu?

Deus não se engana. Os homens é que são obrigados a modificar suas leis, por imperfeitas.

 As de Deus, essas são perfeitas.

A harmonia que reina no universo material, como no universo moral, se funda em leis estabelecidas por Deus desde toda a eternidade.”


617. As leis divinas, que é o que compreendem no seu âmbito?

Concernem a alguma outra coisa, que não somente ao procedimento moral?

“Todas as da Natureza são leis divinas, pois que Deus é o autor de tudo.

O sábio estuda as leis da matéria, o homem de bem estuda e pratica as da alma.”

 


617-a. Dado é ao homem aprofundar umas e outras?

“É, mas em uma única existência não lhe basta para isso.”

Efetivamente, que são alguns anos para a aquisição de tudo o de que precisa o ser, a fim de se considerar perfeito, embora apenas se tenha em conta a distância que vai do selvagem ao homem civilizado?

Insuficiente seria, para tanto, a existência mais longa que se possa imaginar.

Ainda com mais forte razão o será quando curta, como é para a maior parte dos homens.

Entre as leis divinas, umas regulam o movimento e as relações da matéria bruta: as leis físicas, cujo estudo pertence ao domínio da Ciência.

As outras dizem respeito especialmente ao homem considerado em si mesmo e nas suas relações com Deus e com seus semelhantes.

Contém as regras da vida do corpo, bem como as da vida da alma: são as leis morais.

 


618. São as mesmas, para todos os mundos, as leis divinas?

“A razão está a dizer que devem ser apropriadas à natureza de cada mundo e adequadas ao grau de progresso dos seres que os habitam.”

 


2 - Conhecimento da Lei Natural 

 

619. A todos os homens facultou Deus os meios de conhecerem Sua lei?

 

“Todos podem conhecê-la, mas nem todos a compreendem. Os homens de bem e os

que se decidem a investigá-la são os que melhor a compreendem. Todos, entretanto, a compreenderão um dia, porquanto forçoso é que o progresso se efetue.”

A justiça das diversas encarnações do homem é uma conseqüência deste princípio, pois que, em cada nova existência, sua inteligência se acha mais desenvolvida e ele compreende melhor o que é bem e o que é mal.

Se numa só existência tudo lhe devesse ficar ultimado, qual seria a sorte de tantos milhões de seres que morrem todos os dias no embrutecimento da selvageria, ou nas trevas da ignorância, sem que deles tenha dependido o se instruírem? (Ver itens 171-222)

 


620. Antes de se unir ao corpo, a alma compreende melhor a lei de Deus do que depois de encarnada?

“Compreende-a de acordo com o grau de perfeição que tenha atingido e dela guarda a intuição quando unida ao corpo. Os maus instintos, porém, fazem ordinariamente que o homem a esqueça.”

 


621. Onde está escrita a lei de Deus?

 

“Na consciência.”

 


621-a. Visto que o homem traz em sua consciência a lei de Deus, que necessidade havia de lhe ser ela revelada?

“Ele a esquecera e desprezara. Quis então Deus lhe fosse lembrada.”

 


622. Confiou Deus a certos homens a missão de revelarem a Sua lei?

 

“Indubitavelmente. Em todos os tempos houve homens que tiveram essa missão.

São Espíritos superiores, que encarnam com o fim de fazer progredir a Humanidade.”

 


623. Os que hão pretendido instruir os homens na lei de Deus não se têm enganado algumas vezes, fazendo-os transviar-se por meio de falsos princípios?

  

“Certamente hão dado causa a que os homens se transviassem aqueles que não eram inspirados por Deus e que, por ambição, tomaram sobre si um encargo que lhes não fora cometido.

Todavia, como eram, afinal, homens de gênios, mesmo entre os erros que ensinaram, grandes verdades muitas vezes se encontram.”

 


624. Qual o caráter do verdadeiro profeta?

 

 “O verdadeiro profeta é um homem de bem, inspirado por Deus.

Podemos reconhecê-lo pelas suas palavras e pelos seus atos.

Impossível é que Deus se sirva da boca do mentiroso para ensinar a verdade.”

 


625. Qual o tipo mais perfeito que Deus tem oferecido ao homem, para lhe servir de guia e modelo? 

“Jesus.”

 

Para o homem, Jesus constitui o tipo da perfeição moral a que a Humanidade pode aspirar na Terra.

Deus no-lo oferece como o mais perfeito modelo e a doutrina que ensinou é a expressão mais pura da lei do Senhor, porque, sendo ele o mais puro de quantos têm aparecido na Terra, o Espírito Divino o animava.

Quanto aos que, pretendendo instruir o homem na lei de Deus, o têm transviado, ensinando-lhes falsos princípios, isso aconteceu por haverem deixado que os dominassem sentimentos demasiado terrenos e por terem confundido as leis que regulam as condições da vida da alma, com as que regem a vida do corpo.

Muitos hão apresentado como leis divinas simples leis humanas estatuídas para servir às paixões e dominar os homens.

 


626. Só por Jesus foram reveladas as leis divinas e naturais?

Antes do seu aparecimento, o conhecimento dessas leis só por intuição os homens o tiveram?

“Já não dissemos que elas estão escritas por toda parte?

 

Desde os séculos mais longínquos, todos os que meditaram sobre a sabedoria hão podido compreendê-las e ensinálas.

Pelos ensinos, mesmo incompletos, que espalharam, prepararam o terreno para receber

a semente.

Estando as leis divinas escritas no livro da Natureza, possível foi ao homem conhecê-las, logo que as quis procurar.

Por isso é que os preceitos que consagram foram, desde todos os tempos, proclamados pelos homens de bem; e também por isso é que elementos delas se encontram, se bem que incompletos ou adulterados pela ignorância, na doutrina moral de todos os povos saídos da barbárie.”

 


627. Uma vez que Jesus ensinou as verdadeiras leis de Deus, qual a utilidade do ensino que os Espíritos dão?

Terão que nos ensinar mais alguma coisa? 

 

“Jesus empregava amiúde, na sua linguagem, alegorias e parábolas, porque falava de conformidade com os tempos e os lugares.

Faz-se mister agora que a verdade se torne inteligível para todo mundo.

Muito necessário é que aquelas leis sejam explicadas e desenvolvidas, tão poucos são os que as compreendem e ainda menos os que as praticam.

A nossa missão consiste em abrir os olhos e os ouvidos a todos, confundindo os orgulhosos e desmascarando os hipócritas: os que vestem a capa da virtude e da religião, a fim de ocultarem suas torpezas.

O ensino dos Espíritos tem que ser claro e sem equívocos, para que ninguém possa pretextar ignorância e para que todos o possam julgar e apreciar com a razão.

Estamos incumbidos de preparar o reino do bem que Jesus anunciou.

Daí a necessidade de que a ninguém seja possível interpretar a lei de Deus ao sabor de suas paixões, nem falsear o sentido de uma lei toda de amor e de caridade.”

 


628. Por que a verdade não foi sempre posta ao alcance de toda gente?

 

“Importa que cada coisa venha a seu tempo. A verdade é como a luz: o homem precisa habituar-se a ela, pouco a pouco; do contrário, fica deslumbrado.

“Jamais permitiu Deus que o homem recebesse comunicações tão completas e instrutivas como as que hoje lhe são dadas.

Havia, como sabeis, na antigüidade alguns indivíduos possuidores do que eles próprios consideravam uma ciência sagrada e da qual faziam mistério para os que, aos seus olhos, eram tidos por profanos.

Pelo que conheceis das leis que regem estes fenômenos, deveis compreender que esses indivíduos apenas recebiam algumas verdades esparsas, dentro de um conjunto equívoco e, na maioria dos casos, emblemático.

Entretanto, para o estudioso, não há nenhum sistema antigo de filosofia, nenhuma tradição, nenhuma religião, que seja desprezível, pois em tudo há germens de grandes verdades que, se bem pareçam contraditórias entre si, dispersas que se acham em meio de acessórios sem fundamento, facilmente coordenáveis se vos apresentam, graças à explicação que o Espiritismo dá de uma imensidade de coisas que até agora se vos afiguraram sem razão alguma e cuja realidade está hoje irrecusavelmente demonstrada.

Não desprezeis, portanto, os objetos de estudo que esses materiais oferecem.

Ricos eles são de tais objetos e podem contribuir grandemente para vossa instrução.”

 


III – O BEM E O MAL 

629. Que definição se pode dar da moral?

 

“A moral é a regra de bem proceder, isto é, de distinguir o bem do mal.

Funda-se na observância da lei de Deus.

O homem procede bem quando tudo faz pelo bem de todos, porque então cumpre a lei de Deus.”

 


630. Como se pode distinguir o bem do mal?

 

“O bem é tudo o que é conforme à lei de Deus; o mal, tudo o que lhe é contrário.

Assim, fazer o bem é proceder de acordo com a lei de Deus. Fazer o mal é infringi-la.”

 


631. Tem meios o homem de distinguir por si mesmo o que é bem do que é mal?

 

“Sim, quando crê em Deus e o quer saber. Deus lhe deu inteligência para distinguir um do outro.”

 


632. Estando sujeito ao erro, não pode o homem enganar-se na apreciação do bem do mal e crer que pratica o bem quando em realidade pratica o mal?

 

“Jesus disse: vede o que queríeis que vos fizessem ou não vos fizessem. Tudo se resume nisso. Não vos enganareis.”

 


633. A regra do bem e do mal, que se poderia chamar de reciprocidade ou de solidariedade, é inaplicável ao proceder pessoal do homem para consigo mesmo.

Achará ele, na lei natural, a regra desse proceder e um guia seguro?

 

“Quando comeis em excesso, verificais que isso vos faz mal.

Pois bem, é Deus quem vos dá a medida daquilo de que necessitais.

Quando excedeis dessa medida, sois punidos.

Em tudo é assim.

A lei natural traça para o homem o limite das suas necessidades.

Se ele ultrapassa esse limite, é punido pelo sofrimento. Se atendesse sempre à voz que lhe diz - basta, evitaria a maior parte dos males, cuja culpa lança à Natureza.”

 


634. Por que está o mal na natureza das coisas? Falo do mal moral.

Não podia Deus ter criado a Humanidade em melhores condições?

 

“Já te dissemos: os Espíritos foram criados simples e ignorantes (115).

Deus deixa que o homem escolha o caminho.

Tanto pior para ele, se toma o caminho mau: mais longa será sua peregrinação.

Se não existissem montanhas, não compreenderia o homem que se pode subir e descer; e não existissem rochas, não compreenderia que há corpos duros.

É preciso que o Espírito ganhe experiência; é preciso, portanto, que conheça o bem e o mau.

Eis por que se une ao corpo.” (119)

 


635. Das diferentes posições sociais nascem necessidades que não são idênticas para todos os homens.

Não parece poder inferir-se daí que a lei natural não constitui regra uniforme?

 

“Essas diferentes posições são da natureza das coisas e conformes à lei do progresso. Isso não infirma a unidade da lei natural, que se aplica a tudo.”

As condições de existência do homem mudam de acordo com os tempos e os lugares, do que lhe resultam necessidades diferentes e posições sociais apropriadas a essas necessidades.

Pois que está na ordem das coisas, tal diversidade é conforme à lei de Deus, lei que não deixa de ser una quanto ao seu princípio.

À razão cabe distinguir as necessidades reais das factícias ou convencionais.

 


636. São absolutos, para todos os homens, o bem e o mal?

 

A lei de Deus é a mesma para todos; porém, o mal depende principalmente da vontade que se tenha de o praticar.

O bem é sempre o bem e o mal sempre o mal, qualquer que seja a posição do homem.

Diferença só há quanto ao grau da responsabilidade.”

 


637. Será culpado o selvagem que, cedendo ao seu instinto, se nutre de carne humana?

 

“Eu disse que o mal depende da vontade. Pois bem! Tanto mais culpado é o homem, quanto melhor sabe o que faz.”

As circunstâncias dão relativa gravidade ao bem e ao mal.

Muitas vezes, comete o homem faltas, que, nem por serem conseqüência da posição em que a sociedade o colocou, se tornam menos repreensíveis.

Mas, a sua responsabilidade é proporcionada aos meios de que ele dispõe para compreender o bem e o mal.

Assim, mais culpado é, aos olhos de Deus, o homem instruído que pratica uma simples injustiça, do que o selvagem ignorante que se entrega aos seus instintos.

 


638. Parece, às vezes, que o mal é uma conseqüência da força das coisas.

Tal, por exemplo, a necessidade em que o homem se vê, nalguns casos, de destruir, até mesmo o seu semelhante.

Poder-se-á dizer que há, então, infração da lei de Deus?

 

Embora necessário, o mal não deixa de ser o mal. Essa necessidade desaparece, entretanto, à medida que a alma se depura, passando de uma a outra existência.

Então, mais culpado é o homem, quando o pratica, porque melhor o compreende.”

 


639. Não sucede frequentemente resultar o mal, que o homem pratica, da posição em que os outros homens o colocam?

Quais, nesse caso, os culpados?

 

“O mal recai sobre quem lhe foi o causador.

Nessas condições, aquele que é levado a praticar o mal pela posição em que seus semelhantes o colocam tem menos culpa do que os que, assim procedendo, o ocasionaram.

Porque, cada um será punido, não só pelo mal que haja feito, mas também pelo mal a que tenha dado lugar.”

 


640. Aquele que não pratica o mal, mas que se aproveita do mal praticado por outrem, é tão culpado quanto este?

 

"É como se o houvera praticado.

Aproveitar do mal é participar dele.

Talvez não fosse capaz de praticá-lo; mas, desde que, achando-o feito, dele tira partido, é que o aprova; é que o teria praticado, se pudera, ou se ousara.”

 


641. Será tão repreensível, quanto fazer o mal, o desejá-lo?

 

“Conforme.

Há virtude em resistir-se voluntariamente ao mal que se deseja praticar, sobretudo quando há possibilidade de satisfazer-se a esse desejo.

Se apenas não o pratica por falta de ocasião, é culpado quem o deseja.”

 


642. Para agradar a Deus e assegurar a sua posição futura, bastará que o homem não pratique o mal?

 

“Não; cumpre-lhe fazer o bem no limite de suas forças, porquanto responderá por todo mal que haja resultado de não haver praticado o bem.”

 


643. Haverá quem, pela sua posição, não tenha possibilidade de fazer o bem?

 

"Não há quem não possa fazer o bem.

Somente o egoísta nunca encontra ensejo de o praticar.

Basta que se esteja em relações com outros homens para que se tenha ocasião de fazer o bem, e não há dia da existência que não ofereça, a quem não se ache cego pelo egoísmo, oportunidade de praticá-lo.

Porque, fazer o bem não consiste, para o homem, apenas em ser caridoso, mas em ser útil, na medida do possível, todas as vezes que o seu concurso venha a ser necessário."

 


644. Para certos homens, o meio onde se acham colocados não representa a causa primária de muitos vícios e crimes?

 

“Sim, mas ainda aí há uma prova que o Espírito escolheu, quando em liberdade, levado pelo desejo de expor-se à tentação para ter o mérito da resistência.”

 


645. Quando o homem se acha, de certo modo, mergulhado na atmosfera do vício, o mal não se lhe torna um arrastamento quase irresistível?

 

“Arrastamento, sim; irresistível, não; porquanto, mesmo dentro da atmosfera do vício, com grandes virtudes às vezes deparas.

São Espíritos que tiveram a força de resistir e que, ao mesmo tempo, receberam a missão de exercer boa influência sobre os seus semelhantes.”

 


646. Estará subordinado a determinadas condições o mérito do bem que se pratique?

Por outra: Será de diferentes graus o mérito que resulta da prática do bem?

 

“O mérito do bem está na dificuldade em praticá-lo.

Nenhum merecimento há em fazê-lo sem esforço e quando nada custe.

Em melhor conta tem Deus o pobre que divide com outro o seu único pedaço de pão, do que o rico que apenas dá do que lhe sobra, disse-o Jesus, a propósito do óbolo da viúva.”

 


Divisão da lei natural

 

647. A lei de Deus se acha contida toda no preceito do amor ao próximo, ensinado por Jesus?

 

“Certamente esse preceito encerra todos os deveres dos homens uns para com os outros.

Cumpre, porém, se lhes mostre a aplicação que comporta, do contrário deixarão de cumpri-lo, como o fazem presentemente.

Demais, a lei natural abrange todas as circunstâncias da vida e esse preceito compreende só uma parte da lei.

Aos homens são necessárias regras precisas; os preceitos gerais e muito vagos deixam grande número de portas abertas à interpretação.”

 


648. Que pensais da divisão da lei natural em dez partes, compreendendo as leis de adoração, trabalho, reprodução, conservação, destruição, sociedade, progresso, igualdade, liberdade e, por fim, a de justiça, amor e caridade?

 

Essa divisão da lei de Deus em dez partes é a de Moisés e de natureza a abranger todas as circunstâncias da vida, o que é essencial.

Podes, pois, adotá-la, sem que, por isso, tenha qualquer coisa de absoluta, como não o tem nenhum dos outros sistemas de classificação, que todos dependem do prisma pelo qual se considere o que quer que seja.

A última lei (justiça, amor e caridade ) é a mais importante, por ser a que faculta ao homem adiantar-se mais na vida espiritual, visto que resume todas as outras.”

 


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